🤔 - discos de vinil, tédio, redes sociais e uma virada de chave
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Esses dias eu estava ouvindo alguns discos que meu pai tem com ele. Ele estava de férias e é aquele tipo de pessoa que não consegue ficar parada, então em um fim de semana ele comentou de testar ligar a vitrola no rádio, e eu como uma boa curiosa de vitrola e discos de vinil (por mais que eu tente entender como isso funciona, ainda parece mágica), e sabendo que ele não teria mais nada a fazer no dia, pedi pra ele testar naquele mesmo momento. Eu também estava querendo passar um pouco mais de tempo fora das telas, então fiquei observando todo o processo.

Enquanto escutávamos, meu pai ficou comentando de algumas memórias de quando era mais novo. "Eu colocava esse disco aqui super alto e ia dormir". "Essa o cara colocava pra tocar na discoteca". "As festas na minha época cada um levava um disco pra contribuir com as músicas". "Quando seu vô comprou a primeira rádio vitrola ele também comprou esses discos aqui". Eu fiquei imaginando a juventude do meu pai, da minha mãe e como era a vida antes da internet e dos aparelhos digitais. Fiquei me perguntando como lidavam com o tédio, o que faziam durante a tarde de um domingo. Fiquei bem reflexiva. E quando não existia televisão? Minha mente de geração Z explode só de pensar.

E isso aconteceu justamente quando eu já estava um pouco reflexiva sobre diversas coisas na vida. Eu tenho achado quase tudo chato, como se já tivesse vivido tudo que poderia viver dentro da minha realidade atual. Como as coisas têm andado devagar em quesito avanço na minha vida, esse sentimento acaba piorando. Mas será que é um sentimento válido? Será normal uma pessoa da minha idade já pensar dessa forma? Provavelmente não, então eu decidi investigar a raiz do problema.

Apareceu pra mim no Youtube como recomendação um vídeo do Matheus Sodré - epidemia de cinismo. Nada do que ele fala é algo novo, apesar de nunca ter parado pra pensar a respeito de que realmente, o mundo está um caos e as redes sociais só tem piorado a visão disso. E das piores formas possíveis. Eu nunca fui muito cronicamente online quando se trata de redes sociais. Compartilhar a minha vida com detalhes extremamente pessoais e ainda por cima com imagens sempre foi motivo de desconforto. Odiava quando me marcavam em fotos no Facebook sem me perguntar. Nunca tive Instagram. Nunca compartilhei com seguidores uma foto marcando o lugar em que estava. Talvez as redes que eu mais usei foram Orkut e Twitter, e este último até pouco tempo, porque se tornou um lugar extremamente hostil e chato. Assim como a vida ultimamente, as redes também se tornaram insuportáveis pra mim.

O Twitter virou um lugar de pessoas chegarem afirmando com poucas palavras coisas que elas não entendem e ganhar likes de pessoas que também não entendem. Se algum dia você estiver na rua e for atropelado e alguém filmar, cuidado, porque tem grandes chances do pessoal lá viralizar o vídeo e dizer que você é uma pessoa estúpida. Como que uma pessoa em sã consciência se deixaria ser atropelada dessa forma? Como é possível que você não tenha visto o carro? Cuidado ao reclamar do seu ambiente de trabalho, porque se descobrirem que você ganha um salário alto, irão te cancelar. Como assim você está reclamando de um lugar que suga todas as suas energias, é preconceituoso, desumano, ganhando um salário desse?

O Instagram é uma vitrine do lado bom da vida. Ali nenhum casal tem brigas, ninguém é pobre, todo mundo só viaja e tem muitos amigos, e ninguém tem medo de ficar compartilhando pra desconhecidos onde mora e onde está no momento. O TikTok eu sinto que aos poucos tem virado Twitter: afirmações sem fundamento de pessoas que se acham espertas. O algortimo do TikTok é safado, mas comigo não rolou. Basicamente, ele funciona assim: 

  • Você vai interagindo com diversos vídeos e tudo isso é guardado. Os likes, tempo de exibição, absolutamente tudo que você faz ali é monitorado. Vamos supor que você adora vídeos de Dachshunds (os famosos cachorros salsichinhas). A maioria dos vídeos que você assiste mais da metade, copia o link para compartilhar com alguém, dá like, são vídeos que contém algo relacionado a eles.
  • Aos poucos, você percebe que boa parte do seu feed são sobre salsichinhas, muito legal, né? Mas seu feed nunca é 100% de salsichinhas, às vezes aparecem alguns vídeos virais que não tem nada a ver, às vezes até vídeos que ainda não possuem nenhum like e de assuntos completamente aleatórios.
  • Com o passar dos dias o seu tempo no aplicativo aumentou, porque você tem passado cada vez mais tempo tendo que rolar o feed pra conseguir ver os cachorrinhos que você tanto gosta no meio de outros vídeos, e nem todos eles chamam sua atenção... e isso porque você sabe que eles vão aparecer em algum momento. E quando aparecem, você fica muito feliz! 

A psicologia por trás disso é a mesma de casinos. Você começa a jogar e de vez em quando ganha alguma coisa, mesmo que centavos. Isso faz você acreditar que é possível ganhar mais, então você continua jogando. Quanto mais você joga, mais você acha que vai ganhar, porque o jogo te faz acreditar nisso com pequenos prêmios em meio a quase nenhum prêmio. O feed do TikTok é igual: ele te bombardeia de vídeos legais, mas tudo em exagero cansa rápido, então aos poucos ele vai te encher de vídeos aleatórios, e só de vez em quando vai vir os vídeos que vão te agradar. E você fica feliz, porque estava na expectativa disso acontecer. Mas comigo isso não funcionou, porque eu comecei a achar isso um porre. Se mesmo dizendo pro algoritmo que eu quero MUITO assistir determinada coisa, mas só de vez em quando ele me premia, por que continuar perdendo meu tempo? Eu também percebi que o Twitter estava me tratando de forma muito semelhante.

Então eu decidi parar de usar quase que 100% o pouco que eu tinha. Desinstalei os aplicativos do celular e só de vez em quando acesso pelo computador - e fica a dica, o algoritmo nas versões de desktop não funciona direito, então você tem grandes chances de não passar muito tempo nas redes. No início eu me senti um pouco perdida. Sentava para tomar meu café da tarde no meio do expediente e abria a pasta do meu celular onde ficava os aplicativos, mas eles não estavam mais lá. Ficava pensando: e agora?

Agora, eu consigo chegar e dizer: a vida está um pouco mais simples. Eu ainda tenho muitos problemas comigo mesma, até porque a comparação, a inveja, o sentimento de atraso e tudo que as redes sociais ajudam a piorar sempre existiram e sempre existirão, mas as coisas estão mais calmas. Aos poucos eu tenho deixado de me preocupar com a vida dos outros e me preocupar mais com a minha. Voltei a ler (livros e blogs). Tenho mais tempo para estudar. Meu sono nunca esteve tão bom há anos (não fico mais no celular antes de dormir). Voltei a fazer caminhada e lutar contra o sedentarismo que já tem me feito mal. Comecei a ouvir podcasts. Minha concentração está melhor. Tenho passado mais tempo com os meus pais. Fiquei com vontade de comprar quebra-cabeças, um kit de robótica. Tenho ido ao cinema sozinha. Tenho olhado mais pela janela. Tenho tido mais opinião própria. E tudo isso graças às horas diárias que voltei a ter.

Faz bem não sermos bombardeados todos os dias e o tempo todo com notícias ruins - desgraças no mundo acontecem o tempo inteiro, mas ninguém tem psicológico para aguentar uma bomba diária disso. Também faz bem deixar de ficar vendo só o lado bom da vida das pessoas todos os dias. Se você se afastar das redes e achar que vai ficar pra trás no que está acontecendo no mundo, não vai. O que for realmente importante vai chegar até você de alguma forma. Eu tenho escutado um podcast diariamente com um resumo do que aconteceu no dia anterior, e tem sido uma experiência muito boa e menos rápida - o que permite o cérebro a absorver melhor. E ah, seus amigos de verdade ainda vão manter contato.

Eu amo a internet, mas infelizmente algumas coisas dentro dela - redes sociais - estão saindo do controle e não estavam me fazendo bem. Não sinto falta e tento incentivar mais as pessoas a fazerem o mesmo, se possível.

Comentários

  1. Oi Lia! Acabei de cair de paraquedas no seu blog e amei! O layout é muito gracinha e nostálgico, o que combinou muito com a publicação. Também tenho tido problemas com as redes sociais, quero muito reduzir o uso, mas fico adiando. Acho que fico presa entre a vontade de ficar offline e a vontade de continuar falando sobre livros na internet. Preciso encontrar um meio-termo que me permita viver as delícias de ter meu cérebro menos derretido.

    Garota do 330

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    1. Oi Vaneza, seja bem-vinda! Fico muito feliz com seu comentário!
      Tudo é equilíbrio, né? No início é difícil achar esse meio-termo, mas te garanto que em pouco tempo você sente a diferença. Às vezes sinto vontade de largar totalmente (e das redes sociais de certa forma já consegui), mas vez ou outra ainda sinto aquela vontadezinha de ver o que as pessoas andam fazendo... Um passinho de cada vez!

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