🙈 - eu não era desejada e isso definiu minha autoestima
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Até hoje eu tenho problemas de autoestima com a minha aparência. Tudo começou quando eu tinha por volta dos 12 anos e fiquei sofrendo bullying até meus 16. Eu comecei a ter pelos pelo corpo e rosto e em uma quantidade um pouco maior do que as outras meninas da sala. Obviamente, isso chamou a atenção de alguns garotos e fui vítima dos mais diversos apelidos e piadas sem graça (mas muito engraçadas pra eles). Eu sofri com isso por anos porque os pelos não me incomodavam, eu nem percebi a existência deles até começarem a apontar pra minha cara. Tenho vergonha de olhar para algumas fotos antigas e perceber que realmente meu buço marcava bastante. Eu vivia andando de calça e casaco com capuz, pois assim sentia que conseguia me esconder melhor. Nunca usei shorts ou bermuda na escola. Minha mãe nunca conversou comigo sobre isso. Cheguei a sofrer bullying de um tio durante um almoço em família na frente de vários primos, que acharam engraçado. Nunca falei pros meus pais ou pra escola que eu passava por isso, carreguei tudo comigo mesma. Por volta dos 16, eu decidi começar a fazer a sobrancelha e o buço pra me sentir mais confortável (todas as outras garotas já faziam isso desde cedo) e parei de ser vítima de piadas.

4 anos de bullying é muita coisa, não tem como isso não te afetar de uma maneira gigantesca. Hoje em dia eu não ligo para os meus pelos, faço quando tenho vontade e quando posso. Mas há resquícios desse trauma. Não gosto de tirar fotos ou de ser encarada. Quando alguém conversa comigo olhando mais para a região dos lábios, logo acho que está olhando alguns pelos que ficaram ali e fico desconfortável. Quando converso perto de um homem hétero que eu não conheça direito, tendo a esconder a boca com as mãos ou ficar mais afastada do que o normal. E falando sobre homens, eu nunca fui muito atraente pra eles, e isso também me afetou na adolescência.

Sabe aquela fase que seus colegas de escola começam a ter os primeiros namoradinhos? Passam o intervalo de mãos dadas, trocam presentes em datas importantes, raramente trocam um beijinho em público. Eu tive colegas que começaram aos 9, outras aos 13. Quando percebi, todas as minhas colegas já tinham se relacionado com alguém, menos eu. Na época eu me questionava: por que ninguém que eu acho atraente se interessa por mim? Boa parte foi devido ao bullying, e uma parte também talvez seja porque não sou uma mulher muito atraente.

Uma vez dois colegas meus queriam brincar de "Rebelde Brasil". Um seria o Pedro e a outra seria a Alice, eu seria a Carla. Pedro e Alice faziam casal na novela assim como a Carla e o Tomás. Alguém tinha que ser o Tomás, ele disseram. Foram perguntar para um colega de turma que já nos conhecia desde os primeiros anos de escola, ele era o mais "parecido" com o Chay Suede (ator que interpretou o Tomás). Segundo o que me contaram, perguntaram pra ele se ele queria ser o Tomás, mas ele perguntou quem seria a Carla. Quando disseram que era eu, não quis.

Outra vez entrou um garoto novo na sala. Na época achei ele bonitinho (não sei o que tinha na cabeça pra pensar isso). Eu tinha uma mania chata de ficar lançando olhares pra pessoas que eu achava atraente, com ele não foi diferente. Fiquei o dia todo dando olhares para ele que nunca eram retribuídos. No final do dia, quanto estávamos esperando o sinal tocar para ir embora, em meio ao silêncio escuto um murmúrio. Um colega que estava sentado na fileira ao lado me chama e diz: "Ó, tá te chamando de bigoduda aqui". Ele apontava pro garoto novo.

Todas as vezes que alguém dizia gostar de mim nunca foi pela minha aparência. Eu não sei até hoje se fico feliz ou triste por isso. Feliz porque as pessoas me enxergam mais pelo o que eu sou. Triste porque em um primeiro momento não chamo atenção por ser bonita. Claro que não queremos alguém que só se interesse pelo nosso rosto e/ou corpo, mas perceber que nunca era nem um pouquinho pelo meu rosto me incomodava. Principalmente porque uma das minhas colegas mais próximas da escola era considerada uma das mais bonitas da sala, então ela tinha sempre quem ela queria - ao todo teve cerca de uns 10 namoradinhos ao longo de todo o período escolar. Ninguém nunca recusou ela. Eu, por outro lado, fui recusada e humilhada algumas vezes. Até hoje, 100% das vezes que acho alguém atraente percebo que o sentimento não é recíproco. Eu já tive dois namorados, e com eles não foi diferente, se apaixonaram pela pessoa que sou, e não pela aparência. Eu já percebi sim alguns olhares por outras pessoas, mas no caso quem não foi recíproco foi eu (kkkk). A pessoa me achou atraente, mas eu não podia falar o mesmo. E no fundo no fundo meu pensamento não é que a pessoa me achou bonita, mas sim feia ao ponto de ficar encarando.

Nunca postei foto minha na internet com medo de comentarem algo maldoso, de talvez alguém que fizesse bullying comigo tentasse ser engraçado ali também. Olho pras minhas fotos e me acho feia em todas elas. Fico com inveja de outras mulheres quando vejo que elas chamam mais atenção de uma pessoa específica do que eu. Sinto que todos me acham esquisita. Queria ser olhada mais vezes, mas quando me olham acho que é julgamento. Queria poder entrar na mente do meu namorado e entender se ele realmente me acha bonita ou a paixão que o cegou pra pensar dessa forma. Tive uma crise dos 20 quando percebi que aos poucos estou deixando de ter cara de novinha, enquanto algumas colegas de faculdade ainda estão há alguns anos de passar por isso.

Toda essa necessidade de validação ocorre lá no fundo da minha mente, mas vez ou outra alguma coisa escapa e me atinge. Hoje em dia o primeiro pensamento que tenho é até agradecer por ninguém me olhar, visto que odeio chamar atenção, sou muito introvertida. Me arrumo pouco quando saio de casa, só pra ficar bonita pra mim mesma. Mas, tem alguns momentos que abalam um pouco a minha mente. Por exemplo na faculdade. Eu sou se não a mais velha das garotas da sala (que já não tem muitas). Ninguém olha pra mim, nem os que tem a minha idade, o que em um primeiro momento não me importo. Mas eu já percebi que olham para outras meninas, conversam mais com elas. Tudo bem, pode ser que eu não seja muito amigável, sente na sala afastada de todos e esteja sempre de cara fechada, mas o trauma que eu tenho de ser rejeitada pela minha aparência volta à tona, e começo a relembrar de tudo. Começo a achar que estou velha, que meu cabelo é feio, que meu rosto foi uma das combinações mais feias que poderia ter saído da genética dos meus pais. Que meus pelos estão marcando de novo meu rosto. Volto a me concentrar nos estudos e logo penso: eu quero mais é que todo mundo aqui se exploda. E volto a viver normalmente. Até algum pedacinho do trauma ressurgir.

Sinto que a cada ano da minha vida tenho melhorado. Me importando cada vez menos com a opinião alheia e me importando apenas comigo mesma, buscando cada vez menos validação. Acho que os traumas são assim. A gente nunca vence eles completamente, mas ficam cada vez mais trancados numa caixinha interna. Às vezes algum gatilho faz com que um pedacinho consiga sair, e vai ser assim a vida toda, mas nós vamos amadurecendo pra que esses pedacinhos já não tenham mais tanto poder sobre nós.

Comentários

  1. Muleee, já me chamaram de feia um monte de vezes na escola, na cara dura! Eu ficava boba com a sinceridade daqueles zé ruelas kkkkk. Até na faculdade, com um monte de marmanjo, rolavam comentários sobre meu cabelo bem na minha frente. Riam… e eu ria junto, porque nem sabia como reagir àquilo.

    A questão é que o mundo ao redor construiu um padrão tão estabelecido, que eu nasci e cresci conformada com a ideia de que eu não era “aquilo”. E ninguém nunca tentou me mostrar o contrário (mãe não conta, né, como sempre).

    E vamos lá… eu também sou bem peluda, bora unir as mãos porque tamo no mesmo barco (não sei se chega a ser hirsutismo o nome). Eu evitava usar calças curtas por causa das pernas, arrancava sobrancelha, bigode… e isso era muito alimentado pela minha família, que sempre soltava um “nossa, mas tu é cabeluda viu kkk” (repara nos risos no final). Então, eu não via motivo pra achar que lá fora seria diferente.

    No meu caso, eu também odiava minha cor de pele. Achava minhas pernas muito escuras, meu cotovelo… e me escondia também. Hoje em dia eu só… existo. Até porque nem saio muito de casa. Eu só cansei mesmo.

    Fico muito besta com como temos semelhanças. Embora eu nunca tenha me importado tanto — talvez porque sempre fui isolada, e não tinha motivos pra tentar sair do isolamento.

    Acho super importante esse discurso de autoaceitação, mas… não é fácil. Nem de longe. Você fica nessa de “ah, eu não ligo, me amo, tá tudo bem”, mas lá no fundo, as cicatrizes gritam um tico mais alto. E isso é meio chato. Talvez fazer esse processo sozinha torne tudo ainda mais difícil.

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    1. Eu no começo ria de nervoso também, mas acho que chegou em um ponto que eu estava tão machucada que nem força mais tinha pra rir da situação, sabe? Só queria que a escola acabasse logo. Hoje se alguém falar alguma coisa eu só mando tomar naquele lugar, kkkk.

      O processo de amar a si mesmo em um mundo que julga tanto não é fácil, mas acredito que com a idade e maturidade a gente vai aprendendo. Sinto que as redes sociais pioram isso também, sabe? Felizmente na minha pré-adolescência ainda não se falava muito de Instagram, e na época era diferente, né? Não era aquela luta do melhor ângulo, maquiagem etc.

      Espero que possamos no futuro voltar a este post e pensar como mudamos e como somos felizes nos aceitando, confio que vai dar certo :).

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